quarta-feira, 23 de maio de 2012

A NATUREZA DA ANSIEDADE EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES

 

O medo é uma experiência humana universal; para crianças, adolescentes e adultos ele pode servir como uma resposta adaptativa em muitas situações. Os medos em jovens são comuns, transitórios e sua aparência e resolução podem ser vistas como parte de um processo de desenvolvimento normal. Assim, a mera presença de medos não é um indicador de psicopatologia, podendo, frequentemente, ser necessários ao desenvolvimento normal. Em outros momentos, as reações de medo e ansiedade podem ser um impecílio ao desenvolvimento. As diferenças entre medo, fobia e ansiedade são importantes para clarificar o quadro diagnóstico. O medo é visto como uma resposta a uma experiência circunscrita de ameaça, em oposição à ansiedade, que é considerada uma resposta menos diferenciada a um estímulo difuso. As fobias são medos severos e implicam em padrões comportamentais de fuga persistente. Os medos são parte do desenvolvimento normal e emergem e recuam inteiramente. Uma categoria separada das desordens de ansiedade foi introduzida no DSM II. Três subtipos foram identificados: Desordem de Ansiedade de Separação, Desordem de Fuga e Desordem de Ansiedade Excessiva. Embora as desordens possam se sobrepor, cada subtipo tem características distintas. A Ansiedade de Separação envolve ansiedade em relação à antecipação da separação de crianças mais velhas ou da figura de ligação. Ela inclui perigo iminente e preocupação com a morte que resulta em atividade reduzida longe de casa. Timidez extrema e afastamento de novas situações ou pessoas caracterizam a Desordem de Fuga, onde a ansiedade é mais forte e cotidiana, permanecendo além do período de desenvolvimento. A Desordem de Ansiedade Excessiva é uma ansiedade generalizada que inclui medo de avaliação, auto-consciência e ruminação acerca do passado ou futuro, Do ponto de vista clínico, em oposição ao empírico, muitos consideram estas distinções passíveis de mudanças.
Vários dados sugerem que a mudança no conteúdo dos medos, ao longo do tempo, reflete a crescente experiência da criança do mundo e o aumento de sua percepção da realidade. Os medos das crianças envolvem desde conteúdos globais imaginários, incontroláveis (monstros) até conteúdos específicos, diferenciados e realistas, tais como aceitação social e desempenho escolar . Os medos podem ser uma forma de a criança lidar com obstáculos com os quais ela se confronta . Além das mudanças de desenvolvimento no conteúdo do medo, mudanças quantitativas também ocorrem. Em geral, a pesquisa sugere um decréscimo no número de medos com o aumento da idade . Mas, mesmo adolescentes mais velhos (16-18 anos) relatam medos. Diferenças sexuais no número de medos foram descobertas. Tanto relato materno quanto auto-relato mostraram uma prevalência maior de medos entre meninas (Bauer, 1976; Lapouse e Monk, 1959; Olledick et. al., 1985). Entretanto, expectativas de papéis sexuais ou outros fatores socioculturais podem determinar estes relatos (Bauer, 1976; Ollendick et. al., 1985).
Apesar da idade e nível de desenvolvimento ditarem algumas dimensões dos medos infantis, as diferenças individuais existem. Campbell (1986) propôs que influências como temperamento, contexto e experiência passada podem determinar a forma que os medos assumirão ( pesadelos, medo de molhar a cama, acessos de raiva, afastamento social, comportamento agressivo).
Os clínicos e pesquisadores vêem a ansiedade infantil como um constructo multidimensional que possui manifestações fisiológicas, comportamentais e cognitivas. As respostas motoras na ansiedade são importantes e têm sido objeto de pesquisa (Barrios e Hartmann, 1988). Os componentes motores comuns da ansiedade incluem fuga, voz trêmula, postura r;ígida, choro, roer unha e chupar dedo (Barrios e Hartmann, 1988). As reações fisiológicas incluem: aumento na atividade nervosa automática, transpiração, dor abdominal difusa (“borboletas no estômago”), rubor, necessidade urgente de urinar, tremor e desconforto gastrointestinal (ver também Barrios e Hartmann, 1988). Uma variedade de pensamentos de crianças ansiosas têm sido descritos; estes incluem pensamentos de ser assustado ou ferido, pensamentos de auto-crítica, ou pensamentos de perigo. Entretanto, até recentemente, poucos trabalhos empíricos têm examinado as cognições em crianças clinicamente ansiosas. Francis (1988), em sua recente revisão das cognições de crianças ansiosas, concluiu que “nenhuma afirmação definitiva sobre as cognições de crianças ansiosas pode ser feita”(p.276). Estudos usando amostras não clínicas de medos circunscritos, como teste de ansiedade (Zatz e Chassin, 1983, 1985), ansiedade de separação (Prins, 1986), ou ansiedade de dentista (Prins, 1985), descobriram que alta ansiedade está associada com cognições auto-referentes negativas. Exemplos incluem: “Eu vou estragar tudo”, “Eu vou me ferir novamente”. Já baixa ansiedade está associada com uma frequência menor de pensamentos negativos, o que Kendall (1984) chamou de “poder do pensamento negativo”. Usando uma escala desenvolvida recentemente, Kendall e Ronan (1990b) identificaram um conjunto de auto-afirmações que caracterizam as crianças ansiosas.
Kendall (1985) propôs, ainda, a distinção entre distorções cognitivas e deficiências cognitivas na conceitualização da psicopatologia infantil. As deficiências referem-se a uma ausência de pensamento onde seria benéfico (e. g., agir antes de pensar). Os déficits no processamento de informação envolvem uma falha da criança em se engajar na previsão e planejamento da ação. As distorções refrem-se a um processo disfuncional de pensamento (e. g., exagerar uma ameaça ao eu). Na processamento distorcido da informação, o indivíduo está atento para as questões sociais ou do meio ambiente e está processando ativamente estes dados, mas o processamento é disfuncional (distorcido) e desadaptativo. As separações baseadas nestes critérios ajuda a clarificar a natureza da disfunção cognitiva em uma série de desordens psicológicas. Por exemplo, as crianças ansiosas parecem preocupadas com as avaliações sobre si e sobre os outros e com a probabilidade de uma série de consequências negativas. Elas parecem compreender erradamente as demandas do meio ambiente. Ao mesmo tempo, elas não parecem ser deficientes no processamento da informação.
A avaliação e tratamento das desordens infantis tem uma característica única: o processo de avaliação deve levar em conta as mudanças decorrentes do desenvolvimento da criança ao longo de sua vida. As mudanças cognitivas, socioemocionais e biológicas são diferentes numa criança de 8 ou 9 anos em relação a uma criança de 12 ou 13 anos. Já o tratamento cognitivo-comportamental dessas desordens infantis segue certos parâmetros que discutiremos em outro artigo, porém, via de regra, está voltado para um enfoque sintomatológico, comportamental e cognitivo, e, ao mesmo tempo, inclui uma orientação psicológica aos pais e/ou pessoas significativas da vida da criança.
Resumo baseado em TRATANDO AS DESORDENS DE ANSIEDADE EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES (Philip C. Kendall. Tamar E. Chamsky, Michael Freidman, Ray Kim, Elizabeth Kortlander, Frances M. Sessa e Lynne Siqueland)
Fonte: KENDALL, P. C. (ed.) Child & Adolescent Therapy. Cognitive-Behavioral Procedures. New York, Guilford Press, 1991.
FONTE RESUMO: DENISE AMORIM RODRIGUES – NPCC.

 

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